Os parceiros externos da Guiné-Bissau têm vindo intensificar acções de lobbying junto dos actores políticos guineenses para um entendimento com base no acordo de 10.Set alcançado em Bissau, após uma missão de alto nível da CEDEAO. Prevê-se para os próximos dias o arranque negociações directas entre os partidos, em Abuja (Nigéria) ou Conacri (Rep Guiné), por delegações a constituir. A negociação deverá ser conduzida pelo presidente da comissão da CEDEAO, Marcel Souza.
(ANTECEDENTES)
Na reunião de 20.Set da Comissão das Nações Unidas para consolidação da
paz (PBC) na Guiné-Bissau, a margem do debate anual
da Assembleia Geral/ONU, o acordo foi considerado uma “conquista
significativa”, e a sua implementação pedida com “rapidez”. Para a
mediação do acordo contribuíram Alpha Condé, PR da Guiné, Ernest Bai
Koroma, PR da Serra Leoa, com apoio dos presidentes Ellen
Johnson Sirleaf (Libéria) e Macky Sall (Senegal). O secretário-geral da
ONU, Ban Ki-moon, aceitou receber o PR da Guiné-Bissau, José Mário Vaz,
a quem incentivou a conclusão do acordo.
Publicamente,
ambos os líderes do PAIGC e PRS têm demonstrado cautelas. Domingo
Simões Pereira (PAIGC), no acto central de comemoração do
60º aniversário do PAIGC, a 19.Set na sede do partido, manifestou
disponibilidade para o “diálogo inclusivo, a reconciliação e a coesão
interna do partido”, sublinhando que o PAIGC deve ser reconhecido “como a
formação política escolhida pelo povo para governar
nesta legislatura”. Da reunião do Comité Central do PAIGC, 16.Set, não
saiu qualquer decisão sobre a participação no futuro governo. Victor
Pereira, PRS assumiu que o acordo é omisso quanto a qual dos partidos
irá chefiar o governo – PIGC ou PRS, mais próximo
do PR José Mário Vaz, cujo antagonismo em relação a Domingos Simões
pereira tem servido de força motriz do diferendo político.
JMV,
que deverá regressar no final da semana de Nova Iorque, tem-se
desdobrado em deslocações ao estrangeiro, acompanhado do MNE Soares
Sambu
e de Umaro Ccissoko, figura apontada por fontes em Bissau como
empenhada em encabeçar o novo governo, promovendo lobbying interno nesse
sentido, a nível externo e junto dos dois partidos, com resistências
sobretudo no PAIGC (AM 106). Depois do Sudão no inicio
de Set.2016, JMV regressou a 16.Set de um périplo pela República do
Congo, Chade e Senegal. Internamente, tem-se esforçado por isolar DSP
(AM 1062). A crescente impaciência da comunidade internacional perante a
incapacidade de ser encontrada uma solução a
nível interno, com as instituições paralisadas por conflitos
interpartidários (AM 1059), levou ao acordo, que prevê a formação de um
governo de consenso e inclusivo para a implementação da plataforma
resultante da mesa redonda de Bruxelas (2015), para dirigir
o país até as próximas eleições em 2018 e incumbido de revisão da
Constituição, que redefina o papel do executivo, do Parlamento e do
aparelho judicial.
O
acordo seguiu-se a um “forcing” de mediação em Bissau, no inicio
Set.2016, dos chefes de diplomacia da Libéria, Togo e Guiné-Conacri,
juntamente
com Marcel de Souza, em missão de mediação da crise política. Reuniões a
06.Set com o ministro dos Negócios Estrangeiros Soares Sambu, PM Baciro
Djá, direcções de PAIGC e PRS, e grupo dos 15 deputados expulsos do
PAIGC. A 07.Set, mantiveram encontros de trabalho
com o presidente da ANP Cipriano Cassamá e PR José Mário Vaz.
Os
apelos da CEDEAO têm sido paralelos a incentivos, como a
disponibilidade para desbloquear brevemente fundos para o inicio do
programa
de reforma do sector militar guineense, nunca implantado devido á
instabilidade governativa, e ameaças de desmantelamento, dentro de 6
meses da ECOMIB, força de interposição instalada em Bissau desde 2012
Em
declaração divulgada a 04.Set, na sequência de Briefing de 30.Ago pelo
Representante Especial do Secretário-Geral e Chefe do gabinete
da ONU na Guiné-Bissau (ONIOGBIS), Modibo Touré, o conselho de
Segurança da ONU já havia reafirmado a “necessidade urgente de garantir
um governo funcional.”. PAIGC e o PRS deveriam “ainda mais trabalhar
neste sentido”, dada “a importância de garantir a estabilidade
em toda presente legislatura”. O comunicado incluía também uma
referência à necessidade de “respeitar a Constituição do Estado de
direito ” na busca de soluções.
(ANÁLISE)
O acordo de 10.Set representa a mais significativa evolução política
recente na crise da Guiné-Bissau. Contudo, fontes em Bissau
vêem o mesmo com reserva, apontando-lhe fragilidades – a saber:
-
A não atribuição ao PR de um papel claro na solução, antes remetendo a
responsabilidade para os dois partidos, a solução, é também interpretada
como uma tentativa de remeter o PR para o papel menos interventivo, a
ser formalizado na posterior revisão da Constituição, mas JMV tem vindo a
afirmar e estender o seu poder e, sobretudo desde a demissão de DSP, e à
luz do persistente conflito entre ambos,
é improvável que venha a abdicar da actual influência.
-
A questão de qual dos partidos – ou se uma terceira figura
“independente” - deve assumir a presidência é controversa, mesmo dentro
do PAIGC
– onde se advoga o direito de governar em resultado da vitória nas
legislativas de 2014, ao mesmo tempo que outros questionam a sensatez de
assumir a chefia de um governo a prazo, numa situação de grande
influência por parte do PR, no PRS há focos de oposição
à entrega doo governo ao PAIGC e, mais intensamente, a que o posto de
PM seja assumido por DSP.
-
Fontes em Bissau indicam que a CEDEAO, promoveu um acordo verbal entre
as partes de que seria o partido vencedor das eleições (PAIGC) a
constituir governo, optando por não inscrever esta disposição no texto
assinado, com fim de preservar o estatuto de mediador isento entre as
partes.
-A
oposição do PR a uma solução que reforce o poder do PAIGC, e sobretudo a
obtenção de pastas chave no executivo, sobre o qual tem actualmente
preponderância, é esperada por fontes habilitadas da política
guineense; com as recentes visitas ao estrangeiro, JMV procurou quebrar o
isolamento a que estava a ser sujeito, sobretudo entre parceiros
influentes (AM 1047); terá também obtido fundos necessários
ao exercício de poderes fácticos no meio político e judicial.
-
Não é considerado claro, face às disposições constitucionais actuais, e
às de acordo, qual a margem do PR para rejeitar uma solução de
governo que lhe venha a ser apresentada, depois do beneplácito da
CEDEAO ao mesmo.
Além
da atribuição do posto de PM, é esperada disputa entre os 2 partidos em
torno de ministérios a assumir por cada partido, e mesmo secretarias
de Estado. Energia, Economia, Finanças e Transportes são identificados
por fontes habilitadas em Bissau como os Ministérios alvo de maior
disputa, devido ao fluxo de verbas.
À
pressão externa sobre os principais actores da crise – JMV e DSP – a
obtenção de um acordo, soma-se sobre DSP pressão dentro do partido
para que aceite uma solução de governo, aproveitando a “brecha” aberta
pelo acordo para assumir poder em relação ao PR, legitimando o resultado
eleitoral de 2014.
A
incapacidade de convivência política entre DSP e JMV – e em particular
objectivo do PR apagar politicamente o líder do PAIGC- é o elemento
gerador de maior tensão no país, a nível partidário e político, com
ramificação às principais instituições do país. A possibilidade de
sucesso do acordo, cuja negociação será necessariamente prolongada, é
vista por fontes diplomáticas na revisão da Constituição,
potencialmente remetendo o PR a um papel de arbitragem, vedando a
actividade governativa da sua influência. Dada a esperada forte posição
de JMV a tal solução, um governo a emergir do actual acordo estará
sempre sujeito a fortes pressões na sua actuação, com
efeito desestabilizador, previsivelmente limitando a sua longevidade.
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