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Joseph Pulitzer

domingo, 31 de janeiro de 2016

TITINA SILÁ

Hoje foi um dia de homenagens a TITINA SILÁ, figura lendária que povoou o meu imaginário juvenil, como figura de proa, ao lado de Cabral, na Luta de Libertação Nacional. Todas e todos da minha geração conhecem a história oficial, que até mereceu uma canção que me chega à memória. Essa identificação positiva levou-me a interessar pelo caso do seu assassinato.


Depois de ter deixado a Nigéria, com tempo, iniciei esta investigação e solicitei vários apoios nesse sentido.
O ilustre historiador guineense e actual Director do INEP, no seu livro Guerra Colonial & Guerra de Libertação, referindo-se a uma nota consultada nos arquivos da ex-PIDE-DGS e a um informe do PAIGC (aliás, coincidentes) resume assim a ocorrência:

«No dia 31 de Janeiro de 1973, uma vedeta da Marinha portuguesa tinha interceptado uma canoa do PAIGC que atravessava o rio Cacheu, em Tancroal, onde estavam dois médicos cubanos, Ernestina Silá (Titina Silá), Dick Daring e mais dois guerrilheiros que iam a caminho de Conakry para assistir às cerimónias fúnebres de Amílcar Cabral. Todos os elementos tripulantes da canoa caíram à água e fugiram debaixo do fogo, à excepção de Ernestina, que não sabia nadar, e ficou agarrada a um pau, tendo morrido ao ser atingida por uma bala.»

Como podem reparar, há uma primeira nota dissonante em relação à data, um dia depois da data oficial.

Tive a curiosidade de conhecer a versão da tropa portuguesa, e, tratando-se de um caso envolvendo a Marinha, inquiri o ARQUIVO HISTÓRICO DA MARINHA acerca de acções militares, envolvendo «contacto com o IN» (inimigo, na nomenclatura utilizada), nessa data e sector. Encontrei referência ao acontecido no Fundo/Núcleo 236A = Comando de Defesa Marítima da Guiné, em duas pastas separadas, uma referente ao DFE8 (Destacamento Fuzileiros Especiais N.º8), com a quota 4-XVIII-9-4; e a outra referente à LFG (Lancha de Fiscalização Grande) Sagitário, com a quota 4-XVIII-7-5, embora ainda sejam classificadas de «Confidencial», pois estas últimas encontram-se ainda dependentes de autorização superior, para consulta e reprodução.

Segundo o relatório da «OPERAÇÃO SALISBÚRIA» (acerca da qual não consegui apurar mais pormenores ou referências), um grupo táctico de duas parelhas de botes de borracha com fuzileiros do DFE8 que subiam o rio Cacheu, quando, cerca das 16h30, do dia 31 de Janeiro, avistaram um bote de borracha, cujos tripulantes se atiraram à água. Enquanto isso acontecia, os botes portugueses eram flagelados por fogo do PAIGC com origem na margem sul. Depois de os fuzileiros ripostarem e de terem recolhido o bote de borracha (que verificaram ser de fabrico russo e que abandonariam depois no local) e desembarcado na clareira do Jagali, chegou a LFG Sagitário (cerca das 16h50) que bateu a tiro ambas as margens. Como começava a anoitecer e os fuzileiros se encontravam já com poucas munições, reembarcaram todos na LFG Sagitário.

Segundo o mesmo relatório, os fuzileiros regressaram ao local no dia seguinte, dia 1 de Fevereiro, em «patrulhamento ofensivo», no sentido de tentar perceber melhor o ocorrido. Mas o que encontraram ainda os deixou mais confundidos. O chão apresentava vestígios da passagem de muita gente durante a noite, com muitas pegadas, encontrando-se todo espezinhado. Além disso, encontraram abandonada uma canoa em perfeito estado.

O comandante do DFE8, Ferreira da Silva, também se interessou pela questão e publicou em 2010 um artigo, no blog Luís Graça & Camaradas da Guiné, no qual referenciava o seguinte: «Se a morte de Titina Salá se verificou realmente no dia 30 de Janeiro numa acção dos fuzileiros isso só poderia ter acontecido num disparo sobre qualquer movimento suspeito na margem, acções essas que, por serem muito frequentes, não eram registadas.»

Ora, Titina era a responsável pela canoa, e decerto saberia como proteger-se desse género de ameaça.

Há demasiadas contradições em toda esta história.

Na canção e na visão romântica, temos um barco de guerra que lança bombas contra uma canoa. No entanto, na realidade, tudo se passou entre botes de borracha (o barco de guerra só chegou depois) e a canoa, essa, parece lá ter sido posta muito depois...!

Julgo eu que Amílcar Cabral adorava especialmente Titina, entre tantas guerrilheiras e funcionárias do Partido, porque via nela o espírito crítico, a capacidade para pensar com a sua própria cabeça. Que aconteceria se Titina chegasse a Conacri? Certamente iria fazer perguntas indiscretas, iria tentar investigar, para perceber toda a trama que esteve por detrás da morte de Cabral (que ele próprio, aliás, não desconhecia).

Foram criadas as condições para que matassem Amílcar Cabral, aproveitando a inveja e manipulando a insatisfação, sabendo que os executores seriam rapidamente imolados como bodes expiatórios do acto, para apagar as pistas.

Hoje, estudando, lendo e aprendendo, descobrimos que, na história que nos venderam, o que não se aceita é que tenham transformado Cabral num mito romântico, depois de ter sido traído e fuzilado em casa: das vítimas fizeram mártires e campeãs de mitos «mobilizadores», dos quais continuam a abusar passadas mais de quatro décadas de adulteração da sua herança espiritual, praticando uma política deliberada de erradicação do espírito crítico, que nos arrastou até à presente situação.

O recente artigo do Doutor Camais Blinque, de Tite, falando de um caso que também não conhecia (eventualmente por ter sido apagado da história oficial), de um valente comandante do PAIGC Kwad Nandami, conhecido pelo seu pragmatismo, que nos conta que foi morto na mesma altura, parece-me reforçar a necessidade de um esforço historiográfico mais fidedigno, antes que morram as últimas testemunhas.

Terá sido a 30 ou a 31? Nesta teia de contradições, optei por publicar este artigo, que comecei ontem, nesta madrugada do dia 31.

Deixemo-nos de encenações e mantenhamos a unidade em torno dos símbolos nacionais, sem oportunismo político!

Viva Titina Silá!

Vivas às mulheres guineenses.

Que Deus abençoe a República da Guiné-Bissau.

Carmelita Pires
Texto originalmente publicado em:
http://palantanda.blogspot.pt/2016/01/titina-titina-sila.html 


NOTA DO EDITOR 'BR' :

Parece-me ser "Doutor" um estatuto sobre-valorizado atribuído ao Sr. Camais Blinque, face à qualidade do português utilizado e do desestruturado conteúdo do texto. Fez-me lembrar exactamente pelas suas parecenças, a propaganda Salazarista entregue às tropas portuguesas e ao tipo de informação oficial difundida na Metrópela colonial.
Dito isto, (por ausência de conhecimento real ou por má-fé intelectual) manifesta um desconhecimento sobre as várias tipificações e orgânicas das lutas de libertação (e/ou guerrilheiras). P.ex. Vietname, Cuba, Angola, Timor Lorosai, Papua Nova Guiné, Sahara Ocidental, este ocupado há 40 anos pelo último colonialista de África que é Marrocos, ou ainda a Resistência Kurda, etç, atingindo de forma indelével a dignidade dos líderes das mesmas lutas de libertação. 
Estou a referir-me a movimentos guerrilheiros de libertação e não a grupos de traficantes travestidos de guerrilheiros...
Por omissão intencional ou não, escamoteia os aspectos sociais, culturais, e tipo de sobrevivência das populações em teoria (em alguns casos) apoiantes da guerrilha, submetidas directa ou indirectamente a um regime opressor colonial ou ditatorial.
OBS. Tem esta nota, a ver com o segundo 'Link' proposto pela autora do texto acima apresentado.
Carlos Filipe 31/1/2016


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