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Joseph Pulitzer

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Carta à CPLP sobre Missão de Avaliação de Direitos Humanos na Guiné Equatorial

Excelentíssimo Sr. Murade Isaac Miguigy Murargy, Secretário Executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
Excelentíssimo Sr. Georges Rebelo Pinto Chikoti, Ministro das Relações Exteriores da Angola
Excelentíssimo Sr. Mauro Luiz Iecker Vieira, Ministro das Relações Exteriores do Brasil
Excelentíssimo Sr. Jorge Homero Tolentino Araújo, Ministro das Relações Exteriores de Cabo Verde
Excelentíssimo Sr. Mário Lopes da Rosa, Ministro dos Negócio Estrangeiros, Cooperação Internacional e das Comunidades da Guiné-Bissau
Excelentíssimo Sr. Oldemiro Júlio Marques Baloi, Ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Moçambique
Excelentíssimo Sr. Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete, Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros de Portugal
Excelentíssimo Sr. Manuel Salvador dos Ramos, Ministro dos Negócios Estrangeiros, Cooperação e Comunidades de São Tomé e Príncipe
Excelentíssimo Sr. Hernâni Coelho, Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e Cooperação do Timor Leste


Excelências,

As organizações signatárias desta carta lamentam profundamente que a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) tenha aprovado a adesão da Guiné Equatorial como Estado membro de pleno direito durante sua última Cúpula dos Chefes de Estado sem uma avaliação rigorosa do histórico deplorável dos direitos humanos neste país africano. Dada nossa preocupação, nós respeitosamente convidamos a CPLP a realizar uma missão pós-Cúpula independente e imediata no país, com a participação de representantes da sociedade civil, com a finalidade de avaliar a situação in loco e formular recomendações formais para a sua melhoria ao Governo da Guiné Equatorial.

A CPLP, enquanto fórum multilateral, declara seu compromisso com o primado da paz, da democracia, do Estado de direito, dos direitos humanos e da justiça social. Como tal, acreditamos que a CPLP pode e deve assegurar que o Governo da Guiné Equatorial cumpra com esses compromissos e que dê passos concretos e verificáveis para incentivar activamente a adesão do governo da Guiné Equatorial a estes princípios, monitorizando-a de forma independente.

O artigo 6 º do Estatuto da CPLP afirma que a adesão está aberta a "qualquer Estado, desde que tenha o português como língua oficial, mediante a adesão sem reservas aos presentes estatutos". Segundo entrevista concedida ao jornal Voz da Rússia, em março de 2014, vossa Excelência Murad Murargy afirmou que as tentativas anteriores da Guiné Equatorial para tornar-se um membro pleno da CPLP têm falhado "porque havia ainda percepção de que o país não tinha condições em termos de valores e princípios da nossa organização, respeito dos direitos humanos e outros. Também não havia um instrumento que pudesse permitir que fosse feita uma avaliação." [1]

À luz desta afirmação, acreditamos que uma missão independente à Guiné Equatorial permitiria à Comunidade verificar a situação no terreno e julgar por si mesma se o país de fato atende ao requisito de respeitar e promover os direitos humanos consagrados no Estatuto do Fórum. Ademais, permitiria uma avaliação de quais seriam as mudanças práticas, em termos de direitos humanos, na Guiné Equatorial necessárias para manter sua adesão na Comunidade. Tal avaliação proporcionaria uma oportunidade para os membros atuais revisarem se a entrada foi apropriada e, se não for o caso, quais mudanças seriam necessárias.

Tomamos nota de que as violações dos direitos civis e políticos e económico-sociais na Guiné Equatorial têm sido bem documentadas, inclusive por meio do mecanismo de Revisão Periódica Universal no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra. As liberdades de expressão, de associação e de reunião são severamente restritas no país. A oposição política é frequentemente submetida à detenção arbitrária, intimidação e assédio. O direito ao devido processo é rotineiramente desrespeitado. Advogados e outros que visitam centros de detenção relatam que sérios abusos continuam, incluindo espancamentos que equivalem à tortura. Apesar de ter recursos abundantes graças às receitas do petróleo, o governo não cumpre suas obrigações de direitos sociais e económicos. Essas receitas dos recursos naturais financiam estilos de vida luxuosos para a pequena elite em torno do presidente, enquanto uma grande parte da população continua a viver na pobreza. A má gestão de fundos públicos e alegações credíveis de corrupção de alto nível persistem.

Apesar da gama de questões de direitos humanos no país, o único pré-requisito publicamente declarado para a adesão da Guiné Equatorial, como apresentado na mídia por vários funcionários dos países da Comunidade anteriormente à adesão como membro, é a adopção de uma moratória sobre a pena de morte. Lamentavelmente, uma moratória fica aquém da norma definida pelos atuais membros da Comunidade. Além disso, há razões para temer que fora prematura a determinação de que o governo da Guiné Equatorial estaria cumprindo esta condição. A ordem presidencial emitida em fevereiro 2014 só determinou uma suspensão temporária à pena de morte. Além disso, a organização não-governamental Amnistia Internacional informou que, duas semanas antes da emissão da ordem presidencial, o Estado secretamente executou quatro detidos, podendo este número chegar até nove. Até onde sabemos o Governo não negou esta informação, nem forneceu qualquer evidência de que as pessoas identificadas pela Amnistia Internacional como tendo sido executadas permanecem vivas. Há o temor de que as execuções relatadas tenham ocorrido pouco antes da reunião de ministros das Relações Exteriores da CPLP, na qual foi recomendada a admissão da Guiné Equatorial com base no anúncio do Governo de uma moratória. Em nossa opinião, as execuções comprometem seriamente o compromisso declarado do governo de abolir a pena de morte. Outro indício da falta de compromisso é a suposta execução extrajudicial, com o consentimento tácito do Governo, de Maximiliano Abeso Abeso, em maio de 2014.

Ademais, notamos que, embora uma ordem presidencial de moratória sobre a pena de morte tenha sido apresentada como um primeiro passo para a sua abolição, esta é reversível e não tem a autoridade normativa para substituir os códigos militares e penais, nem a Constituição Nacional. Alternativamente, o que sim demonstraria um verdadeiro compromisso com os direitos humanos é a adoção de uma lei formal, que altera cláusula A do artigo 13 da Constituição Nacional, que sanciona o uso da pena capital. Além disso, a Guiné Equatorial assinou o segundo protocolo do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos em 1987, e a sua ratificação seria um passo importante para abolir a pena de morte. Portanto, pedimos que Vossas Excelências façam gestões junto ao Governo da Guiné Equatorial, como Portugal e Moçambique fizerem durante a segunda passagem da Guiné Equatorial por meio do mecanismo de avaliação pelos pares do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, a tomar novas medidas para abolir a pena de morte, como todos os outros Estados membros da Comunidade já fizeram.

No passado, o governo do presidente Obiang não honrou as promessas feitas referente à melhoria da situação dos direitos humanos. Em 2010, o governo concordou em implementar dezenas de recomendações emitidas durante a primeira passagem da Guiné Equatorial no processo de Revisão Periódica Universal. Mas o governo de Obiang tem feito avanços muito limitados para a realização destes compromissos, por isso muitas das mesmas recomendações tiveram que ser repetidas, durante a segunda passagem do país pelo mecanismo de revisão da ONU em 2014.

Por fim, esperamos que a CPLP acate nossas demandas para realizar imediatamente uma missão independente que resultará na elaboração de um roteiro com recomendações concretas que busquem melhorar a situação dos direitos humanos na Guiné Equatorial. Ao fazer isso, a CPLP estaria à altura de seu mandato e prestando um grande serviço aos cidadãos da Guiné Equatorial, contribuindo concretamente para a promoção da dignidade humana e do Estado de direito no país.

Respeitosamente,

Juana Kweitel
Diretora Executiva Interina
Conectas Direitos Humanos

Maria Laura Canineu
Diretora Executiva
Human Rights Watch

Tutu Alicante Leon
Diretor Executivo
Brasil EG Justice

Carta enviada em 31 de março de 2015 




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