LISBOA, 28 de novembro de 2015 (CPR) - Um artigo de ontem do Diário de Notícias com o título "Portugal ofereceu-se para receber 5 mil refugiados. Só 50 aceitaram." gerou uma sucessão de equívocos na comunicação social. Aparentemente, o jornal chegou a esse “título bombástico" a partir de declarações de Luís Gouveia, director adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que, mais tarde, recusou a forma como as suas palavras foram interpretadas.
O título do DN pode vender muitos jornais, mas é claramente demolidor do sentimento de solidariedade para com os refugiados que emana da maioria do povo português. Afinal, existiria por parte dos refugiados uma enorme ingratidão perante um pequeno país que, apesar das dificuldades impostas pela grave crise económica e financeira que atravessa, se dispunha a recebê-los de braços abertos. O título prejudicaria também todo o trabalho de esclarecimento e sensibilização que está a ser feito pelo CPR e outras organizações junto das escolas, autarquias e colectividades que irão acolher os refugiados. "Para quê preocuparmo-nos com os refugiados se eles não querem que os acolhemos?" seria uma pergunta óbvia que muitos portugueses fariam depois de verem o artigo do jornal. Na página do DN online que publicou a notícia, os comentários, assumindo o título como verdadeiro, reflectem bem a indignação dos leitores. A coberto do anonimato, muitos leitores resvalaram, até, para o insulto primário e extremo.
Mais tarde, o mesmo jornal ouviu a Presidente do Conselho Português para os Refugiados (CPR), Teresa Tito Morais, que afirmou não ter elementos suficientes para dizer que há uma recusa por parte dos refugiados em virem para Portugal: “Os refugiados dirigem-se para países onde têm mais referências: amigos, familiares, que necessariamente lhes dão mais confiança",
"A União Europeia acordou recolocar 160.000 candidatos a asilo e até agora só recolocou 159."
acrescentando, "Contudo, não posso deixar de chamar a atenção para a grande inabilidade com que a Europa e os Estados europeus continuam a lidar com este problema, porque perante uma situação dramática que já se vive há largos meses, impunham-se medidas mais concretas e agilizadas no sentido de uma maior mobilização dos Estados".
O próprio director do SEF, Luís Gouveia, esclareceu depois na comunicação social que "o facto dos refugiados preferirem países onde têm familiares, amigos, vizinhos, conhecidos ou, pelo menos, saberem que existem comunidades dos seus países de origem é diferente de dizer que não querem vir para Portugal" recusando a forma como foram interpretadas as suas declarações ao Diário de Notícias, "O processo está a ser mais lento do que o previsto", admite aquele responsável, não lhe parecendo que seja um problema de Portugal. A União Europeia acordou recolocar 160.000 candidatos a asilo e até agora só recolocou 159.
O CPR já foi confrontado com situações idênticas no passado. Por exemplo, quando se organizou a ponte aérea entre Skopje (Macedónia) e diversos países da NATO para evacuação dos campos de trânsito de refugiados kosovares. Nesse caso, a "competição" entre países até era mais forte do que a actual, dado que nela também participaram os EUA, o Canadá e o Reino Unido. O processo de colocação passava também por uma entrevista individual em que era assegurado que cada refugiado sabia qual era o país de destino e que aceitava voluntariamente ser nele instalado. Acontece que muitos refugiados nem sequer sabiam que existia um país chamado Portugal e o esclarecimento passava por questões muito básicas como clarificar, desde logo, que não era uma província espanhola, que as suas fronteiras eram das mais antigas da Europa, etc.
Sendo a maioria dos refugiados constituída por famílias numerosas, uma das perguntas que todos faziam era onde e como seriam acolhidos, se iriam para campos de refugiados, se ficariam isolados dos centros urbanos, etc. Outras perguntas passavam por aspectos relacionados com o emprego, educação, saúde, etc. Mas, para estas pessoas, que fugiam de situações de guerra, de violência e intimidação generalizadas, assegurar que viveriam em tranquilidade, em segurança e num clima de tolerância e de respeito, no seio das comunidades de acolhimento, terão sido os aspectos mais determinantes para a decisão de embarcarem. Contra os receios iniciais, a ponte aérea para Portugal decorreu como previsto, com os aviões sempre cheios, sem faltas ao embarque, numa operação em que foram evacuadas 1270 pessoas em apenas 6 semanas. A recepção e acolhimento dos refugiados por parte dos portugueses foi excelente. Os órgãos de comunicação social desempenharam, em todo este processo, um papel muito relevante.
Estamos certos que após a vinda dos primeiros refugiados ao abrigo do Programa de Recolocação, prevista para muito brevemente, a aceitação de Portugal crescerá exponencialmente, caso não haja obstáculos burocráticos, - "Portugal é uma excelente terra de asilo", será a mensagem que se propagará rapidamente.
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