William Pooley recebeu tratamento experimental ZMapp. Na Libéria, centro dos Médicos Sem Fronteiras mandou embora doentes por falta de camas. Cada país deve pensar como pode ajudar, diz responsável das Nações Unidas.
O enfermeiro inglês William Pooley infectado pelo vírus do ébola, que estava a ser tratado em Londres, saiu nesta quarta-feira do Royal Free Hospital depois de ser tratado com o fármaco experimental ZMapp, avançam as agências.
“Tive muita sorte”, disse o enfermeiro de 29 anos numa conferência de imprensa. “Primeiro, devido ao nível de cuidado que recebi, que está um mundo à parte do cuidado que as pessoas na África Ocidental estão a receber, apesar dos maiores esforços feitos por muitas organizações.”
O enfermeiro apanhou o ébola em Kenema, uma cidade no Leste da Serra Leoa. Ao todo, já morreram neste surto 1552 pessoas, das 3069 que foram infectadas. Este é o maior surto de sempre de ébola, iniciou-se em Dezembro de 2013 na Guiné-Conacri e, entretanto, já se espalhou pela Libéria, Serra Leoa, Nigéria e Senegal.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a 8 de Agosto que esta epidemia era uma “emergência internacional”. Na semana passada, a OMS apresentou um plano de acção para deter este surto dentro de seis a nove meses onde se estimava que, ao todo, 20.000 pessoas serão infectadas. Este plano custará 371 milhões de euros.
Devido à gravidade do surto e da doença – que pode alcançar uma mortalidade de 90% e não tem nenhum tratamento comprovado – a OMS declarou ainda ser ético a aplicação de fármacos ou vacinas experimentais para combater a doença. William Pooley recebeu o ZMapp, um fármaco da Mapp Biopharmaceutical Inc, uma empresa de biotecnologia norte-americana, cujo stock estava esgotado, de acordo com a própria empresa.
Este inglês foi a sétima pessoa a receber este medicamento experimental feito à base de três anticorpos que se ligam ao vírus do ébola. Até agora, duas das pessoas que foram tratadas com o ZMapp morreram da doença. Não há provas de que o tratamento funcione nos humanos, mas um artigo publicado sexta-feira na revista Nature mostra que o fármaco curou todos os chimpanzés infectados com ébola que receberam o tratamento. Seis destes 18 chimpanzés tratados começaram a receber o ZMapp só ao quinto dia da infecção, numa fase adiantada da doença, quando estavam a três dias da morte.
Voltando a William Pooley, o enfermeiro refere que, no seu caso, não teve a pior das experiências: “Os meus sintomas nunca progrediram para as fases piores da doença. Tive alguns sintomas desagradáveis, mas nada comparado com o pior da doença.”
Doentes sem maca
Nos seres humanos, os sintomas do ébola aparecem entre o segundo e o 21º dia de infecção. No início, a doença pode ser confundida com a gripe ou com a malária, aparece febre, dores de cabeça e dores musculares. Mas rapidamente aparecem vómitos, diarreia com sangue, insuficiência renal e hepática e hemorragias internas e externas.
Não havendo fármacos experimentais, os cuidados passam por hidratar as pessoas, controlar a febre, e combater infecções secundárias, esperando que o sistema imunitário seja mais forte do que o ébola.
Mas estes cuidados, que parecem básicos, têm sido um luxo neste surto que afecta três países com sistemas de saúde já de si extremamente frágeis, que ficaram sobre-lotados com a epidemia. Em Monrávia, capital da Libéria, não há camas suficientes para todos os doentes
“Todos os dias temos de mandar embora pessoas doentes, porque estamos cheios”, disse Stefan Liljegren, coordenador dos Médicos Sem Fronteiras do centro ELWA 3, citado na terça-feira pela Reuters. Este centro médico tem 160 camas.
Sem cuidados médicos, as pessoas infectadas têm uma grande probabilidade de morrer. Além disso, fora de um local protegido, estes doentes podem facilmente entrar em contacto com pessoas saudáveis e transmitirem o vírus pelo contacto com os fluídos.
“É muito provável que vejamos o aumento dos casos. Já existe uma transmissão generalizada [do vírus] na Libéria”, defendeu na terça-feira Thomas Frieden, médico e director dos Centros para o Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC, sigla em inglês). “Na Serra Leoa, estamos a ver sinais forte de que o mesmo irá se passar num futuro próximo”, referiu, citado pela Reuters.
Nos últimos dias têm havido protestos e greves em hospitais na Serra Leoa. Por um lado, os profissionais de saúde não têm recebido salários. Além disso, há falta de material e condições para fazerem o seu trabalho, aumentando o risco de eles próprios apanharem a doença. Esta epidemia também tem sido caracterizada pelo enorme número de médicos, enfermeiros e outros profissionais que ficaram doentes. Mais de 120 trabalhadores de saúde morreram, de acordo com a OMS. Na terça-feira, soube-se que um médico norte-americano ficou infectado pelo ébola na capital da Libéria. Esta realidade tem dificultado o combate à doença.
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