Teresa N'Tomba, 40 anos, vivia com "os olhos vendados" até que a
escola para adultos lhe mostrou o mundo, explicou a guineense à Lusa,
relatando como a vida mudou depois de aprender a ler.
A maioria das mulheres da Guiné-Bissau entre os 15 e os 24 anos é
analfabeta: os únicos dados disponíveis sobre alfabetização no país
dizem respeito àquela faixa da população e indicam que apenas 40 por
cento consegue perceber as letras.
Para atacar o problema, o Ministério da Educação alfabetizou cerca de
4000 adultos em 2012, com o apoio do Fundo das Nações Unidas para a
Infância (UNICEF) através de financiamento do governo do Japão.
A implementação do programa arrancou em 2010 com suporte técnico do
governo cubano, funciona em 60 pontos do país e estima-se que este ano
consiga abraçar outros 5000 adultos.
Teresa, com seis filhos, foi uma das mulheres na aldeia de Lendem que
aprendeu a ler e a escrever: ela e as colegas falaram à Lusa em
crioulo, tal como fazem no dia-a-dia, mas seja em que língua for, as
letras deixaram de ser desconhecidas.
"Muitos homens pensavam que nós só servíamos para estar casa",
queixa-se Nita Sanha, 35 anos, mãe de três filhos e outra frequentadora
das aulas, sendo hoje um exemplo de que o alfabeto é ferramenta para
ajudar à igualdade de géneros.
Agora diz-se disposta a trabalhar "em tudo, num gabinete, como
enfermeira ou como jornalista", refere, sem medo de entrar em domínios
por tradição reservados aos homens.
(foto web) |
Augusta Fula, 28 anos, também ganhou novos horizontes, porque já sabe
"ler comunicados", mas com quatro filhos em casa prefere gabar-se de já
conseguir distinguir "quando têm nota positiva ou negativa na escola".
Para além de ajudarem as famílias a vencer novos desafios, estas
mulheres acreditam que são também uma mais-valia para as comunidades
onde vivem, como seja, no acesso a serviços de saúde e prescrição de
medicamentos.
"Antes, quando os médicos escreviam uma receita, não sabíamos nada,
mas hoje conseguimos ler e ter um lugar na sociedade", referiu Isabel
N'Coq Imbali, 39 anos, mãe de cinco filhos.
Todas têm um pedido em comum: querem que o UNICEF continue com o projecto, porque os maridos "também não sabem ler, mas têm vergonha de
estar na mesma classe da mulher", conta Augusta Fula.
Ou seja, encontrar nestas turmas um homem como Tóbana Tchenque, 40
anos, pai de seis filhos, é uma excepção, mas ele dá graças por ter
acompanhado as mulheres.
"Agora quero continuar", contou o lavrador à agência Lusa,
reconhecendo que aquilo que conquistou o ajuda muito: "no mercado eu não
conseguia falar com ninguém" e no hospital "quando o médico começava a
escrever, ficava com medo", atitudes que mudaram depois de perceber os
papéis com que é confrontado.
Nestas acções de alfabetização, aprender a usar o abecedário leva três
meses, com aulas de duas horas, de segunda a sexta, explica Braima
Indjai, representante do departamento de alfabetização do Ministério da
Educação.
Depois, seguem-se outros dois níveis de aperfeiçoamento, igualmente divididos por diferentes trimestres cada.
Mas a principal preocupação reside agora em criar formas de
alfabetização funcional, ou seja, em que é dado emprego a quem aprende a
ler e a escrever, para que "não esqueçam tudo, passados três ou quatro
meses em casa".
Em Lendem, as mães prometem praticar um pouco todos os dias, que mais
não seja, com os filhos, que são hoje mais encorajados a trazer boas
notas da escola.
(Luís Fonseca (texto, vídeo e fotos), da agência Lusa)
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