Morreu o Presidente que queria varrer os males da política
As cataratas de Victoria, que são as maiores do mundo, têm por alcunha "o fumo que troveja". Essa alcunha também serve para descrever Michael Sata, até ontem Presidente de Zâmbia, em cuja fronteira se situam. Sata acaba de morrer em Londres, de doença ainda desconhecida, que o Governo aliás negou durante semanas. Embora o seu período no cargo tenha sido breve - uns escassos três anos - o estilo dele, vigoroso e abrasivo (havia quem lhe chamasse demagógico) deverá influenciar a política no país durante algum tempo.
Sata ascendeu à presidência após três tentativas falhadas. Estava na política desde o tempo de Kenneth Kaunda, o autocrata que dirigiu o país em regime de partido único durante quase três décadas após a independência em 1964. Como membro do UNIP de Kaunda, foi eleito governador de Lusaca, e aí começou a fazer a sua marca, tapando buracos em estradas e construindo infraestruturas. Tinha o hábito de ir para a rua varrer, ao lado dos funcionários, para dar o exemplo. E dizia que também queria varrer corrupção da política.
Quando Kaunda escolheu outro correlegionário para concorrer à presidência em 1991, Sata mudou-se para o MMD, um partido que defendia a democracia multipartidária. Eleito o candidato do MMD, Sata assumiu uma sucessão de postos ministeriais: governo local, Trabalho, Saúde... Mas mais uma vez teve desentendimentos, e saiu para formar o seu próprio partido, a Frente Patriótica. Candidatou-se à presidência, mas teve menos de 4% dos votos.
Nas presidenciais seguintes, a percentagem foi subindo: 29% em 2006, e quase metade dos votos em 2008. Neste ano ele estava convencido que tinha ganho, e inicialmente não aceitou o resultado. Teria ainda mais uma oportunidade, em 2011, e dessa vez conseguiu. Contribuiu o seu tom populista, com inventivas contra os chineses no país. Vivem lá cerca de 100 mil, e os investimentos com essa origem têm feito desenvolver o país, mas também existem tensões para causa da exploração de que os nativos muitas vezes serão vítimas.
Contra os "capitalistas e imperialistas"... mas já pragmático
Após assumir o cargo, Sata moderou as suas declarações sobre o assunto. Mas continuou a prodigalizar tiradas contra os mais diversos alvos, incluindo alguns dos seus ministros. Também manteve uma certa tradição de recorrer a acusações criminais contra opositores políticos, como em tempos houve contra ele. Mesmo assim, o país permaneceu um relativo oásis de paz comparado com alguns dos seus oito vizinhos, por exemplo Angola, Congo ou Zimbabué.
Sata acusava os "capitalistas e imperialistas ocidentais" de estarem a desestabilizar o regime de Robert Mugabe, e procurava manter a sua imagem popular, por exemplo afastando o guarda-chuva aberto com que um assistente quis protegê-lo da pluviosidade durante uma visita oficial, ou afirmando que se recusava a beber água mineral enquanto todos os cidadãos do seu país não tivessem acesso a água potável.
A Zâmbia fica no centro da parte sul da África e tem 752 mil quilómetros quadrados. Dos seus 14,3 milhões de habitantes, uns 60% vivem com menos de dois dólares por dia. É o maior produtor africano de cobre e a subida acentuada dos preços desse mineral tem ajudado bastante a economia nos últimos anos.
(in: expresso)
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