Dois meses depois do incidente com um voo da TAP entre Bissau e Lisboa, em que a tripulação foi forçada pelas autoridades guineenses a transportar 74 passageiros ilegais, ainda ninguém foi responsabilizado e a ligação aérea continua suspensa.
Questionado pela agência Lusa sobre o ponto de situação do processo de averiguações, o Procurador-Geral da República remete para o que já está feito e queixa-se de perseguição.
"Já disse o que tinha a dizer e fiz o que tinha a fazer", refere Abdu
Mané, sublinhando que passou a ser alvo de ameaças que o obrigaram a
mudar de hábitos e a ter seguranças por perto 24 horas por dia.
Continua a trabalhar, mas já não vê os amigos como dantes: "tenho
movimentos limitados" para evitar maus encontros, sobretudo à noite,
refere.
Em Portugal, as investigações mostraram que os viajantes, supostamente
sírios, pagaram milhares de euros para chegar à Europa sem os vistos
necessários, enquanto um inquérito na Guiné-Bissau concluiu que o
ministro do Interior, Suka Ntchama, deu a ordem de embarque forçado.
O governante foi ouvido pelo Ministério Público guineense no dia 23 de
dezembro e segundo o Procurador-Geral da República, Abdu Mané, foi
emitido um mandado de condução do ministro às celas que o diretor-geral
da Polícia Judicia se terá recusado a cumprir.
O advogado do ministro negou a versão do procurador e processou-o por difamação.
Apesar de Suka Ntchama ter colocado o lugar à disposição, continua em
funções, com o primeiro-ministro de transição, Rui de Barros, a referir
que cabe ao Ministério Público apurar todas as responsabilidades
criminais.
O incidente com a TAP parece ter passado a ser assunto "tabu" em Bissau:
o advogado de Suka Ntchama recusa-se a também falar sobre o assunto,
assim como o ministro dos Negócios Estrangeiros, Delfim da Silva - que
apresentou a demissão depois de se afirmar revoltado com o caso.
No entanto, continua também em funções, porque ainda ninguém o demitiu:
"não me posso demitir a mim próprio", referiu à agência Lusa.
Esta semana, Delfim da Silva distribuiu um folheto de 56 páginas no
congresso do PAICG, partido a que pertence, onde escreve sobre a
situação política guineense e refere que o incidente com a TAP foi uma
"bomba diplomática", mas nada mas adianta.
"Do caso dos passageiros sírios falarei extensamente numa outra ocasião", escreve no folheto.
O fim dos três voos diretos semanais entre a Guiné-Bissau e a Europa,
concertado pela TAP com o governo português, foi justificado pela grave
falha de segurança que foi igualmente censurada pela alta representante
da União Europeia, Catherine Ashton.
A 14 de janeiro, à margem de um encontro da Comunidade de Países de
Língua Portuguesa (CPLP), o ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros, Rui Machete, afirmou que o Governo português iria fazer
"alguns esforços" para que fossem retomadas as ligações aéreas, "em
prol" dos guineenses e dos portugueses.
No entanto, também alertou para a necessidade de haver eleições e
ultrapassar "algumas situações jurídicas", como o facto de Portugal não
reconhecer o atual governo de transição, resultante do golpe de Estado
de abril de 2012.
As eleições gerais estão marcadas para 16 de março, mas dificuldades no
recenseamento eleitoral deverão levar a um adiamento da votação para
abril.
A situação está a prejudicar o dia-a-dia dos guineenses, que deixaram de
ter correio e outros serviços logísticos para o resto do mundo, e que
são obrigados a recorrer a várias ligações aéreas para ligar a
Guiné-Bissau a Portugal.
De acordo com os dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) de
Portugal, em 2012 existiam 17.800 guineenses com estatuto legal de
residente no país, sendo a sexta nacionalidade mais numerosa entre os
imigrantes em terras lusas.
Por outro lado, segundo fonte das autoridades portuguesas, estima-se que
existam entre 4500 a 5000 portugueses a residir na Guiné-Bissau.
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