Companhia aérea conseguiu negociar com a Air Senegal pelo menos dois voos, para garantir as viagens dos passageiros.
(foto: publico) |
A suspensão dos voos da TAP entre Lisboa e Bissau está a assumir
fortes contornos políticos. A TAP diz-se interessada em retomar as
ligações regulares com a capital da Guiné assim que haja condições de
segurança, mas, pelo menos por ora, o Governo transitório não está capaz
de lhas garantir.
Citado pela Lusa, o
ministro da Presidência do Conselho de Ministros de Portugal, Marques
Guedes, considerou a situação "completamente incontrolável e
inadmissível". "Houve um forçar por parte das autoridades no local ao
comandante do avião para o embarque daquelas pessoas, sendo certo que
havia manifestamente uma falsificação grosseira dos seus documentos de
viagem", sustentou.
Embora as investigações persistam, o ministro
dos Negócios Estrangeiros da Guiné-Bissau, Delfim da Silva, disse ao
PÚBLICO que duvida que homens armados tenham forçado o chefe de escala e
a tripulação da TAP a embarcar os 74 sírios: “Não estou a ver gente com
armas a obrigar a tripulação a embarcar os passageiros”. O mesmo membro
do Governo saído do golpe de Estado de Abril de 2012 admite, todavia, a
existência de “grande falha de segurança” no embarque.
Para que a
TAP possa voltar a voar para Bissau o mais depressa possível, Delfim da
Silva defende a reactivação do acordo de cooperação entre os dois
países. É uma clara contradição com a posição que o ministro que, por
norma, exerce a função de porta-voz tomara ainda na véspera. Fernando
Vaz dissera então ao PÚBLICO que a suspensão dos voos poderia custar à
companhia aérea portuguesa a autorização para voar para a Guiné.
Há
duas formas de ver o que aconteceu, comenta Carlos Silva, responsável
pela organização não governamental Acção para o Desenvolvimento (AD).
Uma, a de Fernando Vaz, protagoniza uma espécie de corrida para o abismo
e outra, a de Delfim da Silva, é mais cautelosa. “Isto é o isolamento
completo. Este é o único voo regular para a Europa”, explica. Ainda há
seis meses, o aeroporto de Bissau estava na lista negra internacional.
“Aumenta o isolamento político que já existe e que tem vindo a
crescer.”
No Porto, à saída da casa de Manoel Oliveira, onde se
deslocou para felicitar o realizador pelos 105 anos que celebrou na
quarta-feira, o Presidente da República de Portugal, Cavaco Silva,
declarou ser “fundamental que as autoridades guineenses apurem os
responsáveis pelas acções que foram desenvolvidas". "A primeira condição
para [que existam] as ligações aéreas entre dois países é a segurança
dos aeroportos”, comentou o chefe de Estado. “Não foi garantida a
segurança do aeroporto numa ligação aérea com Lisboa. É óbvio que isso é
observado pelas múltiplas companhias aéreas do mundo inteiro.”
A
TAP diz-se interessada em retomar as ligações logo que a Guiné-Bissau
lhe dê as condições de segurança exigidas pelas autoridades portuguesas.
“Não posso garantir isso porque são questões que passam pelo ministro
da Segurança Interna”, afiança Delfim Cruz. O conselho de ministros
guineense já discutiu o assunto duas vezes.
Nos aeroportos de
Bissau e de Lisboa notou-se ao longo desta quinta-feira o rodopio de
quem tem voos para apanhar. O porta-voz da TAP, António Monteiro,
anunciou ao final do dia que a companhia aérea tinha conseguido negociar
com a Air Senegal pelo menos dois voos para garantir as viagens dos
passageiros entretanto canceladas.
Um voo da TAP partirá de Lisboa
no sábado. Em Dakar, os passageiros serão transferidos para um aparelho
da Air Senegal, que os deixará em Bissau no domingo de madrugada. Nesse
mesmo dia, haverá um voo de regresso. Se o problema se estender, a TAP
contratará mais serviços deste género.
“O que aconteceu não ajudou
ninguém e muito menos a Guiné”, reconheceu Delfim da Silva. “Estamos
numa situação delicada e queremos compor as relações com todos os
países”, disse ainda, acrescentando que os funcionários do aeroporto de
Bissau “podem falhar e ser até vulneráveis a algumas situações”.
Teme-se,
na Guiné-Bissau, que haja consequência em Bruxelas. Michele Cerccone,
porta-voz da comissária que trata da política de asilo, lembrou esta
quinta-feira haver dois aspectos a ter em conta: “Por um lado, a
legislação da UE que se aplica aos pedidos de asilo”; por outro, “a
forma como estas pessoas entraram em Portugal”. Sobre este último
aspecto, pediria ao Serviço Europeu de Acção Externa que se pronunciasse
já que em jogo estão as relações entre um país da UE e um país
terceiro. Outro porta-voz, Oivier Bailly, adiantou que mais tarde
apresentariam uma posição “mais consolidada”. “Obviamente, trata-se de
uma situação sem precedentes.” Ao que o PÚBLICO apurou, o Serviço
Europeu de Acção Externa deverá abster-se.
Confrontado com esta
movimentação, Delfim da Silva reconhece que o embarque forçado constitui
“um episódio muito grave e lamentável”. Apesar de tudo, diz que não
passou de uma “ninharia”, se comparado com outros episódios como o dos
africanos a morrer às portas da Europa.
Os 74 cidadãos
estrangeiros, que formam diversas famílias, requereram o estatuto de
asilo político a Portugal. O processo pode arrastar-se uns dois meses. O
SEF começou nesta quinta-feira a ouvir os 51 adultos e dos 23 menores,
que estão alojados em instalações cedidas pela Segurança Social. Como
traziam passaportes contrafeitos, as autoridades terão de documentar as
suas verdadeiras identidades.
(in:publico)
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