“A
cidadania ativa e participação política – o contributo das
plataformas web”
Atualmente
o exercício da cidadania ativa com recurso às plataformas
eletrónicas tem revelado fundamental na redefinição dos aspetos
evidentes e distintivos da vida política e democrática de um País.
Por isso mesmo, a responsabilidade e a coerência na utilização
dessas ferramentas, como meio para o exercício deste “poder” –
um poder enorme sem dúvida – resulta no comportamento que se
pretende estabelecer entre cidadão-público, cidadão-Estado e
Estado-Estado.
Os
últimos acontecimentos que marcaram a vida política mundial, tais
como a primavera árabe, os casos Wikileaks, Assange,
Snowden, Manning
e Greenwald,
em resultado conceito associado a essas tecnologias de informação,
colocam as “opinion-makers” num patamar de responsabilidade
acrescida face ao compromisso que estabelecem entre o próprio
cidadão, o Estado e consequentemente o País.
No
caso da Guiné-Bissau, atendendo ao uso cada vez mais frequente,
desde alguns anos a esta parte, com o surgimento de vários
mecanismos de difusão web, tais como blog, sites, twitter, facebook,
entre outros, que em certa medida têm dado um enorme contributo na
veiculação de informações sobre o país, recupero aqui um artigo
que publiquei em 2004 – “A cidadania: todos os cidadãos têm o
direito e dever de participar direta ou indiretamente na vida ativa
do seu país” – para reforçar a importância desses meios
eletrónicos como ferramentas, cada vez mais em voga, para a difusão
das preocupações sobre os aspetos que observam comportamentos
políticos e democráticos de um País.
Na
verdade todo o cidadão tem o direito e dever de tomar parte na vida
política e na direção dos assuntos políticos do seu país,
diretamente ou por intermédio de representantes, livremente eleitos,
o direito de ser esclarecido objetivamente sobre os atos do Estado e
demais entidades públicas e de ser informado pelo governo e outras
autoridades acerca da gestão dos assuntos públicos, etc. Estes
direitos e garantias de participação política visam concretizar,
no plano político, o direito constitucional elevado à categoria de
direito fundamental, o direito à Cidadania.
A
etimologia, desde logo, indica-nos que esta categoria refere-se à
condição ou a qualidade de cidadão, membro de um estado, de uma
nação, no pleno gozo dos seus direitos políticos, cívicos e
deveres para com esse estado ou essa nação, sendo que cidadão é a
“pessoa” que, na antiguidade clássica, pertencia a uma cidade e
usufruía do direito de cidadania, ou seja, habitante da cidade.
Ora, a
cidade, em boa verdade, é o espaço por excelência do exercício da
cidadania, pois é, essencialmente, na cidade que se exercem aqueles
direitos e deveres. Mas, se no passado a cidade era o lugar onde se
aprende a ser cidadão, hoje, por contraste, aprendemos a ser
cidadãos de múltiplas comunidades, diversas e sobrepostas, através
de distintos meios eletrónicos, navegando em lugares públicos
virtuais, participando em reuniões preparadas eletronicamente em
lugares remotos e presenciando retransmissões desde espaços físicos
que se converteram em cenários globais. Esta deve ser assumida
através de uma forma de cooperação e de entendimento entre os
vários atores que influenciam ou são influenciados por esta lógica
de participação.
Com
efeito, a cooperação artificial que inscreve os cidadãos em
relações múltiplas de interdependência, não desencadeia
espontaneamente a consciência de pertença a uma coletividade, pois
os diversos individualismos e corporativismos, cada vez mais
evidentes, são testemunha disso mesmo.
No
caso da Guiné-Bissau é latente esta dispersão de exercício
democrático de cidadania e de sentido de pertença, situação que
urge ultrapassar rapidamente, criando uma lógica de cooperação
mais estreita entre os vários atores, caso contrário o poder
informativo via tais plataformas, como instrumento de participação
democrática, perderá a sua essência pelo facto do individualismo
sobrepor-se a uma estratégia coletiva de pressão de forma
organizada.
Tanto
assim é que surgem fenómenos como o “nimbismo”, ou seja, o
individualismo exprime-se, em particular, pela recusa de considerar
os interesses coletivos e o desenvolvimento daquilo que os
anglo-saxónicos chamaram de “síndroma NIMBY”, isto é, not
in my back yard. O “nimbismo” configura a expressão de
indivíduos que se sentem fora das coletividades, considerando que
estas apenas têm obrigações para com eles mas não direitos, onde
os ideais, as confissões, a pluralidade, a democracia, a liberdade,
os direitos e as garantias são expressões sintomáticas de uma
identidade forte, reconhecida e credível.
De
facto, ainda existe algum complexo assumido, dentro e fora da nossa
pátria amada, que acaba por coincidir com estes conceitos de teoria
política. Na verdade, alguns indivíduos ainda não conseguiram
libertar-se, infelizmente, das amarras do poder, continuando a
apregoar o patriotismo, o nacionalismo, a unidade e a reconciliação,
quando na verdade tais conceitos não representam quaisquer
significados, reconhecimentos e interpretação possíveis. E outros,
porque se julgam fazer parte de uma elite cuja aceção se apelida de
não progressiva, emaranhada, intrincada e falta de coerência nas
causas que defendem, representando o significado “Nimby”, no seu
resplendor, que transmite os sentimentos muito em voga dos movimentos
locais de reivindicações muito específicas e egoístas.
Porém,
como fazer face a este estado de coisas? Parece-me que ganha
particular acuidade a discussão em torno da necessidade de reforçar
os mecanismos democráticos da sociedade guineense e encontrar novos
campos de exercício da democracia sob pena de ver agravar os
fenómenos de desigualdade de oportunidades e da falta de
participação.
Não
restam dúvidas que a renovação da teoria democrática deve
assentar, antes de mais, na formulação de critérios de
participação política que não confinem esta ao ato de votar
apenas. Implica, pois, uma articulação entre democracia
representativa e democracia participativa. Este é um desafio para a
juventude, sociedade civil, diáspora, políticos e seus dirigentes,
militantes partidários e, acima de tudo, Nação Guineense.
(Luís
Vicente, Out/2013)
(escrito sob acordo ortográfico)
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