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Joseph Pulitzer

segunda-feira, 21 de julho de 2014

A última oportunidade (terá um parto difícil)

É muito frequente considerar-se a Guiné-Bissau um Estado falhado, à deriva, dominado pelo crime organizado.


Todos os indicadores o demonstram na última década. Está muito próximo desse “estatuto”. Não há presença da Administração estatal eficaz em praticamente nenhum sector da vida nacional. Existem serviços quase todos eles dominados por uma corrupção generalizada e ostensiva, que salta à vista de toda a gente. O Estado não consegue cobrar impostos. As actividades económicas desenrolam-se num autêntico maná de economias paralelas, sem taxação, sem controlo de segurança e qualidade.

Alguns destes sectores alimentam-se do caos. Há uma transversalidade do caos.

A Guiné-Bissau foi engolida por problemas de crime organizado, tráfico de drogas, tráfico de seres humanos, o desmatamento, a pesca ilegal, que esgotou os seus recursos naturais. O Porto de Bissau está cheio de contentores carregados de madeiras preciosas que sem destinatários oficiais... alguns governadores provinciais (reconhecidamente corajosos…), denunciam todos os dias estas situações nas páginas dos jornais. Mas não há polícia, guarda-fiscal, exercito, com vontade de parar estes desmandos. Tudo na mais absoluta impunidade. Os tribunais não funcionam, o Ministério Publico tem centenas de processos, sobre crimes graves, incluindo espancamentos de políticos, que estão fechados na gaveta e provavelmente nunca verão a luz do dia.

Há uma sensação de impunidade sobre os militares, umas forças armadas descontroladas, mal alimentadas, mal pagas, sem dinheiro para uniformes, para equipamentos. Ao mesmo tempo há um generalato e almirantado completamente inúteis, desproporcionado em número, que exibe orgulhosamente galões e estrelas brilhantes, e com um poder avassalador. Gente muito “sensível” e orgulhosa.

Desde a guerra civil de 7 de Junho de 1998, que a Guiné Bissau conheceu vários golpes de Estado sangrentos, intentonas, assassinatos consumados de chefes militares, de um Presidente Eleito, tentativa de assassinato de um Primeiro-Ministro no golpe de Abril de 2012.

Nas eleições gerais de Abril e Maio, os eleitores mostraram um cartão vermelho a estes ditadores: querem mudar e querem fazer parte dessa mudança. A grande afluência às urnas em todo o País foi a confirmação de que os guineenses, nas cidades, nas tabancas, na diáspora, querem ser parte de uma transformação radical do actual “status quo”. Os comícios de campanha eleitoral foram marcados pelo civismo. Deve haver poucos lugares no mundo, onde os dois candidatos rivais escolhem para fecho de uma campanha na segunda volta das presidenciais, a mesma praça central de Bissau, em festa, sem discursos inflamados, com os dois campos de apoiantes a trocarem abraços, cumprimentos, entre si.

Fui testemunha privilegiada disso em serviço de reportagem, nos contactos pessoais.

E verifica-se que a generalidade dos guineenses sabe bem que escolhas há a fazer, neste regresso à Ordem Constitucional e no elenco de prioridades, que se podiam encaixar num autêntico programa de emergência nacional.

Não há medicamentos nem alimentos para os doentes internados nos hospitais, o abastecimento de energia eléctrica é caótico, a capital, Bissau, está quase toda às escuras, não obstante os seus residentes pagarem para ter “saldo”, um pré-carregamento de electricidade. Prolifera a poluição do ar por todo o lado, já que a alternativa à electricidade da rede pública, são os milhares de geradores a gasóleo, que não chegam à maioria dos residentes, mas são o motor do funcionamento de estabelecimentos comerciais, hotéis, edifícios públicos, etc.

Tudo isto encarece a prestação de serviços e bens essenciais.

Bissau é uma cidade cara, alguém me dizia que em “certa medida não anda muito longe do Dubai…”

Os produtores de fruta, deslocam-se do interior para os centros urbanos, para comercializarem os seus produtos, e no trajecto são “portajados” várias vezes por supostos fiscais, tornando a vida insuportável a muitos deles, e tudo inflacionando.

O abastecimento de água é igualmente muito irregular, obrigando muitos guineenses a percorrerem longas distâncias com bidões às costas, para poderem cozinhar e matar a sede. As condições higiene-sanitárias são preocupantes, não há recolha de lixo, a alternativa são as queimadas um pouco por toda a cidade. Os esgotos a céu aberto são um autêntico viveiro de mosquitos e de muitas outras coisas insalubres, num país com um clima tropical quente e húmido, onde seres humanos, em especial as crianças e animais, “partilham” uma água pestilenta, perigosa, indutora de doenças como a cólera e a malária.

(por: Luís Nascimento)




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