A Guarda Nacional da Guiné Bissau salvou 61 crianças que iam ser levadas, ilegalmente, para a Gâmbia, depois de elas terem passado dez horas à fome numa carrinha de mercadorias interceptada na cidade de Buba, no sul do país.
(foto: Carla C. Tomás) |
Nas aldeias as crianças são entregues devido à promessa de irem receber educação.
As crianças acabaram por
ser salvas na quinta-feira, na cidade de Buba, onde a Guarda Nacional
guineense as descobriu, devido aos graves indícios da prática de tráfico
de menores, além de várias violações dos direitos da criança.
Este
é o mais recente episódio de um longo historial de tráfico de menores,
em que angariadores guineenses e de países vizinhos convencem aldeias
inteiras, pobres e vulneráveis, a entregar as crianças, prometendo
educação e boas condições em escolas de estudos religiosos.
Invariavelmente,
acabam por passar a infância a mendigar ou a ser exploradas noutras
actividades, explicaram à Lusa membros da missão do Fundo das Nações
Unidas na Guiné-Bissau (UNICEF) e das autoridades nacionais.
No
grupo que escapou a esse destino, a maioria tinha entre quatro a dez
anos de idade e algumas crianças chegaram a passar até dez horas à fome e
à sede enquanto eram transportadas como mercadoria, depois de as
famílias as entregarem em Gã-Sala e noutras aldeias de Tombali de Baixo.
Uma mãe com oito filhos chegou a entregar quatro para a viagem, em que
todos iam ficando cada vez mais apertados, num espaço exíguo, à medida
que as horas passavam e a recolha avançava.
Sem qualquer
documentação legal, foram interceptadas num controle da Guarda Nacional à
entrada de Buba, pelas 17h de quinta-feira, e as explicações dos seis
adultos do grupo não convenceram as autoridades.
O líder dos
angariadores, natural da Gâmbia, disse que estava tudo combinado com os
pais e que apenas lhe competia levar as crianças para território
gambiano, onde o seu pai era o responsável por um sítio onde as
ensinava. Contou até com a ajuda do adjunto do régulo, autoridade
tradicional nas tabancas (aldeias guineenses), que o acompanhava num
jipe, ao lado da viatura em que seguiam os menores.
Este
angariador estaria na zona desde o início do mês a preparar a ação, que
contou também com a ajuda de um camionista guineense que conhece a
região, para onde faz transportes duas vezes por semana.
O líder e
principal suspeito de tráfico de menores (entre outros crimes) assim
como outros adultos do grupo, ficaram detidos em Buba e aguardam o
desenrolar do processo, entretanto entregue ao Ministério Público.
As
crianças foram acolhidas na primeira noite numa unidade de alojamento
local, onde receberam colchões e mantimentos de organizações
humanitárias que trabalham na região, e foram depois transferidas para o
escritório da missão das Nações Unidas. É ali e com o apoio do UNICEF
que aguardam pela chegada dos pais e familiares que entretanto estão a
ser chamados pela polícia e através da rádio.
Pelo menos duas
crianças mostravam sinais de estarem doentes e todos estavam "abaladas
psicologicamente", explicou Mussá Indjai, responsável pelo Comité de
Prevenção de Tráfico de Seres Humanos, que junta diversas entidades. Se
algumas, mais velhas, conseguiam perceber a situação, a maioria não
sabia o que se passava" enquanto eram sujeitas a formas de "pressão"
inerentes ao facto de "serem iniciadas à escravidão".
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